quinta-feira, 22 de setembro de 2011

G.

Moço,  descubro que quando você sente amor e não pode dar, se você é esperto a tendência a sucumbir e se afogar e relutar em fazer a menor das tarefas cotidianas dá lugar a aprender a ver flores imaginárias nas cinzas das horas mortas de dias iguais.
Sinto que tenho ficado esperta.
Amo abrir minha latita de brincos de flamenco e lembrar da sua cara boba olhando pro meu brinco de gota vermelha, e eu constrangida sem saber se é porque gostou muito ou se achou uma baranguice. Te dei os pretos, pra não esquecer de mim. Será que você já esqueceu de mim?
Amo ensaiar o baile do tientos na companhia, porque foi o primeiro que você me viu dançar, e quando a gente dança invocando uma história bonita inteira por dentro eu vejo que os filósofos complicaram demais o que é ter uma experiência mística, porque é só isso: dançar quando quem amamos está perto, mesmo se for uma proximidade presente apenas num passado que é vivo e é dentro. Bem dentro.
Amo tirar os lençóis da máquina de lavar. Isso mostra que eu já aprendi a lavar os lençóis depois que você foi embora, porque por mais que eu tenha prometido pra mim mesma que queria dormir com seu cheiro pra sempre, depois de uma semana que você já foi isso não é mais tão sensato.
Amo vestir meu vestido xadrez, porque você esteve de xadrez no mesmo dia que eu sem acordo prévio.  Amo cada dia três de cada mês, porque é aniversário do dia em que me salvei de achar que intensidade não me cabia mais - e eu ainda ganhei um beijo por causa disso.
Pra cada seu momento de frieza, de distância, do "nunca mais" que eu não ouvi diretamente de você, mas me contaram, uma lembrança bonita. Pra cada lembrança bonita, uma cor nova dentro de mim. E aí, um rodopio, uma gargalhada sem sentido, um "eu não sinto que acabou".
Do arco-íris ao amarelo. E felicidade é amarelo.

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